quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Uma jornada de trabalho com Peter Paul Rubens

"Quermesse", óleo sobre painel, 149x261cm.

     Rubens pintando a obra “Quermesse”
             em seu atelier de Amberes 

 Uma manhã  do século XVII, Quando o sol  começa atravessar as brumas que se acumulam sobre os rios e canais do pais de Flanders, o mestre Rubens se coloca a trabalho, depois de ter ouvido a primeira missa, o que era de costume. Morava em uma luxuosa mansão que mandou contruir quando voltou da Italia. O atelir era um imenso salão  com um  pé  direito muito alto como uma verdadeira escadaria real. Também era equipado com um mecanismo que podia facilmente subir e descer as suas grandes pinturas, tudo projetado por ele. O interior era dividido por pesadas cortinas de veludo, era amplo e claro. De um lado ficava o atelier dos alunos e estes especialistas trabalhavam juntos, em grandes composições que era dirigida pelo mestre, onde as vezes se encontravam reunidas trinta ou quarenta enormes telas arrimadas na parede. Ali trabalhavam  o animalista Frans Snyders, o retratista Van Dyck, Wildens, Lucas van Unden e muitos outros, todo um conjunto de celebridades, os mais habilidosos, ajudantes que em nossos dias o menor  dentre eles seria um mestre. Um moedor de cores preparava as tintas encurvado sobre sua mesa de mármore manejava lentamente o pilão de pedra dura e dosificava os vernizes e os óleos antes de aglutinar aos pigmentos sêcos. Este atelier nao parecia em nada com os  atuais modernos, era só um local profissional, como podemos ver nos quadros de David Ryckaert e Van Ostade; as imensas telas brancas em curso de preparação ou de execução formavam seu único adorno. Não duvidemos que Rubens foi antes de mais nada um verdadeiro industrial, chefe de atelier que ocupava numerosos trabalhadores, podemos comparar nos dias de hoje com os mais famosos cenógrafos, só que entre nossos pintores de cavalete. Rubens tinha uma coleção particular de pinturas e mandou construir uma galeria no patio de seu jardim, com arquitetura parecida com o Panteon de Roma. La estavam, dez obras de Ticiano, seis obras de  Veronese,  dose de  Breughel  e duzentas telas que formavam sua coleção particular que foram colocadas a venda depois de sua morte. Era esta uma galeria verdadeiramente real, e demonstrava bem a consideravel fortuna deste Principe das artes, que trabalhava para todas as cortes da Europa. Sua Galeria abrigava também valiosos vasos de ônix entre outros e tambem muitas  Jóias raras, entalhes e camafeus antigos, assim como estatuas de mármore, marfim e bronze. Um dos mais ricos adornos desta coleção era uma série de cópias dos grandes mestres que o pintor havia executado na Italia e Espanha. Nos dias de mal tempo quando nao podia sair a cavalo como de costume, Rubens então, depois da jornada dura, percorria as salas de sua galeria, examinando estas peças e comparando entre elas as técnicas dos mestres que ele estimava. O velho Breughel, Ticiano e Veronese. E assim, nessa manhã, em uma parte do imenso atelier que estava reservada, Rubens se colocou a trabalho. Colocando em um pesado cavalete o painel de carvalho revestido por tres camadas de gesso fino, moído com a cola e depois cuidadosamente polido que brilhava sob a tênue luz da manhã. Traçado a saguina, o esboço do pintor cobria a superficie com finos arabescos rosados (esboço quadriculado e ampliado feito pelos alunos do mestre). Esfregando com óleo esfumava os traços. Rubens tranquilo e frio, examina com atenção o grande painel, o artista olha com serenidade como um trabalhador que examina seu trabalho. Desprovido por completo do nervosismo romãntico que a literatura relata a respeito dos pintores de fama “o fogo da inspiração”, ele era seguro: nenhuma impaciência sem gestos impulsivos, pois sempre seu talento e seu carater estavam em  perfeita harmonia. Realizava deste modo suas obras  em calma com um metodo e ordem inflexiveis. Uma larga mesa perto dele continha potes de estanho ou de louça, dispostos invariavelmente por grupos de tres: luz, cor local e sombra, em primeiro lugar se encontrava o tom de base indispensável pelos velhos mestres, o famoso verdaccio. Rubens o pintor de Amberes como era chamado, trabalhava com as cores previamente diluídas e usava pouco a paleta na mão a não ser nos ultimos toques. Pegando um pincel redondo feito de cerdas usadas, corrigia algumas atitudes que lhe pareciam incorretas com os gestos dos dançarinos. A ponta bem fina corre sobre o belo painel branco, liso como um crital facilitado pela untuosidade do azeite estendido em veladura; de um simples golpe de punho esmagando o corpo do pincel saturado de tinta transparente firmando as sombras com largas passadas. Assim nasce um arabesco fino e macio como o cabelo de mulher a ciência e a prática prodigiosa do pintor permitem a  admirável improvisação gráfica. Os grupos centrais são tratados por massas e firmados por suas sombras, que amarram a composição do alto a base, com uma larga mancha de tom marrom, líquido e rebaixado. Assim ele esboça acima e a esquerda da composição, a fachada e a sombra do abrigo as grandes  árvores  que a sombreiam.O primeiro plano com um monte de caldeirões de cobre, o tonel e a cuba de madeira onde aparece um cachorro branco; modelados com uma tinta marrom do esboço, estas tintas são iguais, sumamente ligeiras em toda extenção; através do lavado transparente aparece o  fundo branco esmaltado do painel. Rubens depois realsa as cores com veladuras. A manhã ja esta prestes a terminar, quando tomando um instante de descanso o maestro deixa sua paleta e se afasta para apreciar sua obra. Tal qual um camafeo, em dois tons de sanguina e dourado, brilhante e suave, em sua oleosa frescura. O esboço se mostra magistral; satisfeito e tranquilo, então Rubens manda chamar o seu leitor para ler as obras de Sêneca e de Plutarco, que tanto gostava. O habitual de Peter Paul Rubens era, antes do almoco, descansar durante uma hora conversando com seus amigos que o visitavam: eram esses ora Juan Breughel de Velours, o pintor, ora Nikolas Roskox, governador de Amberes, e também seus principais discípulos. Não fazia amizades  se não com pessoas com espirito douto e elevado, ou com os bons pintores. Na hora do almoço o pintor encontrava com sua esposa, a rubia Hélène Fourment, da qual nos deixou muitos retratos ou em estudos de nu que as vezes chegam ser indiscretos, onde nos revela  os mais ocultos encantos desta rosada e soberba filha de Flanders. A comida era curta e sóbria a base de frutas e o artista voltava imediatamente ao trabalho, “pois sua costituicao fisica e moral lhe permitiam trabalhar sem descanso; pensava com razão, que os excessos da mesa enfraquece o espírito e paraliza o talento.” Tinhamos deixado “A Quermesse”, sobre o cavalete no estado de camafeo, em sanguina e marrom dourado  quente. Rubens  então retoma seus largos pinceis de marta; e perto dele esta a mesa de pintar, onde se agrupam os tons preparados de antemão; suas tintas cuja gama  é sempre a mesma e não necessitam de complexas mesclas; os tons estavam colocados  em uma ordem invariavel; pois este mestre de composições fogosas era extremamente meticuloso e metodico. Suas tintas compreendem em todos os tons de luz, pois as sombras estão sempre dadas pelo pardo do esboço que não retoca, a não ser para torna-lo mais quente e em algumas partes aplica um reflexo vermelho. Em primeiro lugar, se encontra o tom de carne, em seguida o famoso vermelhão de Rubens, com estas tintas  o artista sempre começa colorir as manchas, simlesmente aplicadas por planos. Agora cada personagem recebe sua tinta de carne em forma de cor local, as vestimentas são coloridas de igual maneira. Logo Rubens por meio de um pincel curto e sêco , ligando e fundindo entre si os tons em mosaico faz virar suas tintas criando pela mistura de marrons e carnes, novos tons quebrados que modelam os grupos. As  misturas de tons se faz então, não sobre a paleta mas direto no painel. Os esfumados sempre faz de maneira igual com a habilidade prodigiosa do pintor com cor fresca e oleósa, com um pincel de marta dando a ele um aspecto de acabado e liso, sem marcas e estrias. Com o esboço nesta etapa, deixado assim em tons locais e em bistre, chapado e sem brilho, o mestre vai avivar com o auxilio de realces claros, aplicados em pasta expêssa por meio de um pincel muito fino. A fina ponta deixa uns acentos aqui e ali, prende um largo filamento sobre a dobra  de um pano e para realçar as carnes faz resaltar o brilho de uma tôuca, ou de um colo branco. Torneado por um movimento circular do punho  pinta o brilhante volume de uma cerãmica e envolve com um so toque a borda de um caldeirão de cobre; as figuras realçadas de branco puro apenas tingidas de amarelo, adquirem um relevo escultural e, as vezes também nos brilhos das porcelanas. Com acentuações em bistre ou em grises azulados nos narizes, nas bocas entre abertas e nos cabelos;  funde tudo com a cor local por meio de pincel sêco. O papel desses realces é fundamental na obra do artista: são eles que causam o relevo. De forma contraria a certos artistas, que quebram o tom, perdendo integridade, o mestre de Amberes sugere os matizes pelo emprego racional de grises e brancos neutros, em contraste com as grandes massas de cores vivas: é seguro que,  sua técnicas  particular aplicada em suas obras, apesar da simplicidade de pigmentos, cria um grande ar de riqueza e luminosidade. Os toques, finais que tem um importante papel  na orquestração geral do quadro, são os grises-azulados, quase negros, compostos de antemão e cujas tintas, preparadas sempre de forma identica. Este tom frio e o único, tem por finalidade exaltar os tons quentes que formam a massa da composição; Rubens o emprega somente em pequena quantidade e as vezes um pouco violáceo. O grupo central de “A Quermesse”, formado por quatro bailarinos enlaçados, recebe um grande toque que colore o vestido da bailarina caida, logo outras manchas azuladas, distribuidas pelas sombras e sobre toda a superficie do painel, contrasta com os vermelhos intensos reservados para as vestimentas iluminadas, repartidas por igualmente em toda a superficie causando o tom que harmoniza o conjunto. Rubens considerado o pintor do volume, pelo fato de introduzir estes tons frios, as massas adquirem um volume extraordinario, que não se encontra em nenhum outro pintor;” Rubens é realmente o pintor do volume”. A estrutura em degraus da composição a “Quermesse”, que mostra mais de setenta personagens iluminados de frente, parecendo plana; Rubens resolve a questão dividindo em quatro ou cinco grupos, cada um tratado com o principio de um cacho de uva, modelados por conjuntos: nenhum corpo gira solto, mas ligado ao grupo, participa do relevo da massa, os valores claros e os valores quentes se reservam sempre do mesmo lado, os marros e azuis frios sempre do lado oposto. Invariavelmente os lado claro se contrasta com o lado escuro, e partes escuras se destacam sobre o  lado claro. O efeito obtido é assombroso. Examinando o grupo central: os quatro personagens freneticos se escapam do fundo, o ar circula em seu redor, e parecem estar vistos por estereoscópio; o mesmo com os bebedores sentados no chão em primeiro plano, o grupo de conterrãneos que gesticulam, a mãe de vermelho que amamenta seu filho e uma velha que a força, vira uma jarra de cerveja na boca de um menino. Isso não é so um baixo relevo mas um verdadeiro volume ninguém mais do que ele foi tão longe na representação do volume, Rubens em realidade é o mestre da terceira dimensão. Uma obra de Rubens é um mundo, o resumo de varios séculos de experiências pictóricas, sintetizadas por um homem genial. O realismo das atitudes, o estilo, a profundidade, a cor, e sobre tudo a vida intensa o movimento frenetico    foi igualado no seculo XIX, por um gênio de uma cultura muito distinta, o grande mestre japonês Katsushika Hokusai, nascido no lado extremo da terra, nas ilhas japonesas. O grande trabalhador agora um pouco cansado por dez horas de trabalho, pousa uma ultima vez, sua olhada tranquila sobre a obra realizada e, deixando ao seus ajudantes o cuidado com a limpeza dos materiais, da paleta e pinceis. Pensa entretanto no seu belo cavalo andaluz que costuma montar a cada entardecer. Sobre os férteis campos trotava tranquilo, cavaleiro realizado, com chapel emplumado,  enclinado para um dos lados, como se auto-retratou em suas pinturas; agora ja não era o pintor tranquilo e aplicado, mas o grande senhor de presença gentil, seguro de sua classe e de sua fortuna.  




Aqui resumida uma, entre mil jornadas bem cumpridas deste  artísta genial; e este não é  um relato fantástico, foi baseado em documentos verídicos, através de notas de Roger de Piles que visitava o mestre,  "Biografia do Grande Homem", escrita em latin por seu sobrinho Felipe e as cartas pessoais de Rubens.


A técnica moderna do quadro,
Maurice Busset.


Tradução e interpretação 
Gilberto Geraldo 


                                       Museu residencia de Rubens 
                                            
                                                ***
                                    
                                Hans Laagland 
                                           www.hanslaagland.com
                
               Artista atual influenciado por Rubens


                                    "Auto Retrato", 53x120cm., 2003 



                
                       "Natureza Morta com melão", 60x90 cm., 1995




"Natureza Morta com Copo", 44x54cm., 2001




"Retrato do Padre L.Van Schaverbesk"





"Retrato de um Merchant", século XVII




"A Jovem e o Idoso"




"Primeira Natureza Morta com Flores", 40 x50cm., 2006

















Cornelis le Mair
   Artista Contemporâneo 
















 






























 




2 comentários:

  1. Nossa, que viagem...
    Ficaria lendo pelo resto da noite. E me percebi lá, ao lado do cavalete, o cheiro forte do óleo puro e o ambiente carregado de concentração e envolvimento.
    Obrigado por compartilhar conosco, essa experiência que é parte comum de seus dias.

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  2. Fiquei belos minutos observando o "A Jovem e o Idoso"
    Quadro interessante.

    Excelente Blog, Gilberto Geraldo.

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